Obras no Aeroporto Internacional Salgado Filho começam em 2018
Prestes a assumir a responsabilidade pela gestão do Aeroporto Internacional Salgado Filho, em Porto Alegre, a alemã Fraport pede paciência aos gaúchos, mas garante que, até o fim de 2019, o local estará bastante diferente. Há relativa pressa para o início de obras como o novo terminal de passageiros e a ampliação da pista, que já estão com o prazo correndo, mas a Fraport prega a calma para que tudo seja feito da maneira correta e dentro das regras do período de transição, que só deve se encerrar por volta de março de 2018.
Boa parte da diretoria da companhia recepcionou o governador do Estado, José Ivo Sartori, para reunião e visita às instalações do aeroporto de Frankfurt, berço da Fraport. Foi a última parada da curta missão do governo gaúcho à Alemanha em busca de investimentos no Rio Grande do Sul.
“Até março, os pequenos comprometimentos que temos pelo contrato já darão um sinal de vida da Fraport no Salgado Filho, mas, depois do início das obras, esperamos que, em mais ou menos dois anos, todo mundo veja a grande transformação que ocorrerá”, afirmou a CEO da Fraport Brasil, Andrea Pal, após a reunião. Entusiasmada com a oportunidade, Andrea enfatizou, ao mesmo tempo, que o aeroporto não será transformado de uma hora para a outra, pois não se poderia fazer em uma semana um trabalho de anos.
A companhia não descarta antecipar o cronograma de fim das obras prioritárias, mas não acredita que isso seja provável. “Antecipar a pista, por exemplo, é difícil, porque a obra não é simples, a área está muito molhada, e temos que preparar o terreno antes. Provavelmente, vamos precisar do tempo previsto, até para fazer da maneira correta, com qualidade alta”, acrescenta o gerente de projetos da seção de investimentos globais da Fraport, Andreas Montag.
Assinado em julho, o contrato só adquiriu eficácia em 29 de agosto, data que marca o início da concessão e dos prazos para a entrega das obras obrigatórias. Neste primeiro estágio, a Fraport tem 30 dias para elaborar um plano de transferência operacional que garanta a transmissão da gestão sem interrupções dos serviços. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) terá outros 20 dias para aprovar o projeto e, com isso, dar início à segunda fase. Nela, que durará 70 dias, a Infraero continuará administrando o Salgado Filho, com acompanhamento da Fraport.
Na virada de 2017 para 2018, o processo se inverte: os alemães assumem a responsabilidade pela administração, e a Infraero os acompanha. Esse terceiro estágio pode durar de 6 semanas a 3 meses, o que leva à projeção de que a Fraport assuma a gestão sozinha do aeroporto entre março e abril do ano que vem. Até lá, os pequenos comprometimentos, que precisam ser concluídos o quanto antes, envolvem melhorias nos banheiros, elevadores, sinalização, oferta gratuita de Wi-Fi e ar-condicionado.
Obras maiores, como um novo terminal de passageiros com 36 mil m2, um novo edifício garagem para 4,3 mil vagas e 14 novos espaços para aeronaves, possuem prazo de 26 meses (ou seja, precisam ser entregues até outubro de 2019). A ampliação da pista em 920 metros, aguardada há anos, tem prazo maior, de 52 meses, o que joga o limite final para entrega para dezembro de 2021. Os investimentos previstos ficam em torno de R$ 1,9 bilhão, mas não devem parar por aí. A Fraport, que ganhou a concessão por 25 anos (renováveis por mais cinco), diz que trabalhará por um crescimento gradual do aeroporto. A empresa ainda garantiu a criação imediata de 150 a 160 empregos no Salgado Filho, segundo o secretário adjunto de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia, Evandro Fontana.
Empresa vê terminal como hub para a América do Sul
Ainda que não sejam definitivos sobre o que projetam para Porto Alegre, os executivos da Fraport admitem que a localização da cidade é um dos trunfos do Salgado Filho. “Está no coração do Mercosul, e vai crescer muito em importância. Não investimos onde não achamos que vá crescer”, afirmou, durante a apresentação à comitiva do governo estadual, o gerente de projetos da companhia alemã, Andreas Montag.
O gerente argumenta que será feito tudo o que for necessário para atrair um maior número de conexões e linhas, aumentando a eficiência do Salgado Filho. “Vamos incentivar que isso aconteça”, promete Montag, que ressalta ainda o crescimento local da região como outro atrativo. Ele defende que o foco da empresa é com o desenvolvimento geral do Salgado Filho, e não apenas em relação ao transporte de cargas.
Criar um hub (aeroporto utilizado para conexões entre diferentes lugares, como acontece, por exemplo, com Guarulhos), porém, não depende só do Salgado Filho, segundo a CEO da Fraport Brasil, Andrea Pal. “Isso acontece com muitos passageiros querendo ir ou vir usando o aeroporto, depende também, por exemplo, de o governo atrair empresas que mantenham um fluxo permanente de pessoas e cargas”, defende. As projeções não são claras, porque a Fraport argumenta que só agora irá entender de verdade como funciona o Salgado Filho – até aqui, o interesse foi motivado pelos números divulgados pelo governo no leilão da unidade e por avaliações da companhia feitas de fora.
Um dos exemplos preferidos dos alemães para o terminal gaúcho é o aeroporto de Lima, no Peru, concedido à Fraport em 2001 por 30 anos. “Temos bastante orgulho do que conseguimos lá”, garante Montag. De lá para cá, o fluxo de passageiros saltou de 5 milhões para quase 20 milhões de passageiros por ano, com o crescimento anual passando de 3% para 10,6% em média no período da concessão. O motivo são os investimentos, que passaram de US$ 6 milhões por ano para uma média de US$ 23,5 milhões anuais. “A mudança é incrível, e mostra que a concessão pode ser importante e dar retorno grande ao Estado”, garante.
Sede da companhia alemã no Brasil será instalada na capital gaúcha nos próximos meses
O desembarque da Fraport em solo brasileiro não será apenas no Rio Grande do Sul. Além do Salgado Filho, os alemães também venceram o leilão do Aeroporto Internacional Pinto Martins, em Fortaleza (CE). Agora, com os contratos já em vigência, os executivos da companhia estão chegando aos poucos para dar início à transição. A CEO da Fraport para o Brasil, Andrea Pal, por exemplo, só chega em outubro na Capital. Mas será para ficar, porque a sede da companhia no País será em Porto Alegre.
A escolha, segundo Andrea, se deu por três fatores: primeiro, porque o Rio Grande do Sul é culturalmente mais próximo do cotidiano alemão, o que provavelmente facilite a adaptação dos executivos. Em segundo lugar, a distância para grandes centros, como São Paulo e Brasília, que deverão ser destinos frequentes da equipe de Andrea, é menor.
“Assim como tudo referente a nossa atuação no Brasil, ainda estamos em período de testes. Vamos ver como funciona a logística, se a viagem entre Porto Alegre e Fortaleza não consome todo o tempo do dia”, brinca a romena, que trabalha para a Fraport desde 2001 e se muda à Capital assim que encerrar seu trabalho atual na gestão do aeroporto de Pulkovo, em São Petersburgo, na Rússia.
Além disso, e talvez mais importante do que os demais fatores, Andrea acrescenta que o desafio no Salgado Filho é maior do que na capital cearense, por conta das várias obras e prazos exigidos no contrato. “Temos ainda licenças a serem obtidas. Trabalhando com os governos, talvez possamos antecipar os cronogramas”, afirma a CEO.
Aos alemães o governador José Ivo Sartori colocou as secretarias à disposição para ajudar no processo. “Aqui ficamos sabendo das metas, do trabalho, da tranquilidade de um processo feito com seriedade. Eles querem a boa convivência, ter responsabilidade social e fazer uma gestão diferenciada, procurando transformar o Salgado Filho em uma cidade, em uma vida que contemple não apenas passagem e transporte de carga”, afirmou o governador ao fim da visita à Fraport.
Aeroporto de Frankfurt é cartão de visitas da empresa
Hoje gerindo 24 aeroportos pelo mundo (serão 26 quando assumir definitivamente os dois terminais brasileiros), a Fraport tem no aeroporto de Frankfurt sua principal demonstração de força. Surgida em 1924, quando a área de 22 km2 era, ainda, realmente apenas um campo, a empresa o transformou em um megahub, com cerca de 100 operações por hora. O aeroporto de Frankfurt é atualmente o 13º maior do mundo em número de passageiros (foram mais de 60 milhões em 2016) e 10º em movimentação de cargas.
“Os aeroportos maiores que nós podem operar com menos limitações, pois têm sítios muito maiores do que o que temos aqui. Isso faz com que tenhamos de ser muito eficientes, e nossos processos são reconhecidamente os melhores do mundo”, analisa o gerente de projetos da Fraport, Andreas Montag, um dos raros profissionais da empresa que falam português.
Parte do encontro da comitiva do governo gaúcho com os executivos da Fraport passou justamente por uma visita às quatro pistas e outras locações do aeroporto. Uma das paradas, por exemplo, foi no sistema de despacho de bagagens, quase totalmente automatizado e subterrâneo, que reduz os problemas de perdas e furtos, e também a necessidade de mão de obra, escassa no país europeu – mas que só é viável financeiramente com fluxo acima de 25 milhões de passageiros, o que elimina qualquer chance de ser implantado em Porto Alegre.
Sartori e equipe ainda viram a praticamente incessante ida e vinda de aeronaves, que, em apenas uma das pistas, chegavam com intervalos de pouquíssimos minutos entre elas no fim da tarde. Até um problema relativamente raro foi visto. Um avião da Lufthansa, maior companhia europeia, que é acionista minoritária da Fraport e tem em Frankfurt seu principal hub (80% dos voos têm alguma relação com a aérea), percebeu problemas no trem de pouso ao decolar. Deu meia volta e aterrissou, com a presença imediata de diversos caminhões de bombeiros. Há quatro postos deles, que precisam chegar a qualquer ponto do campo em no máximo três minutos.
Levada à bolsa de valores em 2001, a Fraport continua, de certa forma, pública: pouco mais de 50% de suas ações estão nas mãos da prefeitura de Frankfurt e do estado de Hesse, onde fica a cidade. “Conhecemos bem a realidade de empresas públicas e de aeroportos públicos, e também temos aeroportos de todos os tamanhos no portfólio, de gigantes a terminais regionais, como Porto Alegre”, garantiu Montag à comitiva.
Dos € 2,6 bilhões em faturamento em 2016, mais de € 1,5 bilhão veio dos setores de aviação e serviços de superfície (como combustíveis, limpeza e comida para as viagens). O lucro, porém, vem quase todo dos outros dois pilares da empresa: o varejo, referente ao aluguel dos imóveis dentro e no entorno do aeroporto, e as operações internacionais.
Ao andar pelos dois terminais (haverá um terceiro a partir de 2021), é fácil perceber o porquê. Ao longo da história, o aeroporto de Frankfurt foi crescendo, extravasando inclusive por cima de ruas e autoestradas vizinhas. Dentro dele, há hotéis, supermercado, estações de trem, de metrô e uma pequena rodoviária, além de uma infinidade de lojas e restaurantes. Além disso, há dois “bairros” logísticos, chamados de Cargo City, nos quais dezenas de empresas de logística se abrigam. É o que os alemães chamam de cidade aeroportuária, que emprega 81 mil pessoas.
“Quase me assustei do tamanho”, brincou o governador Sartori. “A melhor coisa é verificar in loco a potencialidade da empresa. No mundo alemão, há uma política de que, ao redor deles, vêm outros investimentos; esperamos que transformem o aeroporto em um grande centro de atração”, afirmou Sartori. “O desenvolvimento sustentável de um estado depende muito do sistema de transporte, da questão logística, e acho que daremos um salto”, acrescentou o secretário adjunto do Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia, Evandro Fontana, que espera ainda que outras empresas se sintam motivadas a investir no Rio Grande do Sul com o exemplo da Fraport.
Fonte: Jornal do Comercio 11/09/2017