Estudo viabiliza uso de nanotubos de carbono em estruturas aeroespaciais
Os satélites e as naves espaciais estão sob o risco constante de serem atingidos por projéteis destrutivos, como micrometeoritos e detritos orbitais. A fim de minimizar os danos causados por um eventual choque de partículas nessas estruturas, os engenheiros têm buscado materiais alternativos aos metais e ligas metálicas utilizados hoje na indústria aeroespacial que sejam, ao mesmo tempo, leves, flexíveis e resistentes aos impactos causados por projéteis de alta velocidade.
Um estudo realizado por pesquisadores da Rice University em Houston, nos Estados Unidos, em colaboração com colegas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e as Federais do Rio Grande do Norte (UFRN) e do ABC (UFABC) demonstrou que nanotubos de carbono – folhas de grafeno enroladas de modo a formar uma peça cilíndrica como um canudo de refrigerante com diâmetro equivalente à bilionésima parte do metro – podem ser uma solução para tornar as estruturas aeroespaciais mais resistentes.
Resultado de pesquisas de pós-doutorado realizadas com Bolsa da FAPESP e no âmbito do Centro de Pesquisa em Engenharia e Ciências Computacionais – um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPIDs) financiados pela Fundação –, o estudo foi publicado na revista Applied Materials & Interfaces.
“Conseguimos analisar como os nanotubos de carbono fraturam em escala nanométrica e, a partir dessa análise, desenvolver um processo que permite torná-los ainda mais resistentes para aplicações em estruturas aeroespaciais”, disse Douglas Soares Galvão, professor do Instituto de Física Gleb Wataghin da Unicamp e um dos autores do estudo, à Agência FAPESP.
Os pesquisadores estudaram a quebra de nanotubos de carbono ao sofrerem um impacto em diferentes velocidades.
Para isso, utilizaram um canhão balístico hipersônico da Nasa, a agência espacial norte-americana, instalado na Rice University, capaz de disparar pequenas partículas a velocidades muito superiores à do som.
“O canhão foi projetado pela Nasa para estudar os efeitos a longo prazo do choque de micropartículas com coletores de energia solar e outras partes da Estação Espacial Internacional”, explicou Galvão.
A fim de avaliar como os nanotubos de carbono quebram durante um impacto em alta velocidade, os pesquisadores moldaram pelotas do material, que foram disparadas contra um alvo de alumínio pelo canhão balístico hipersônico em três diferentes velocidades.
As análises dos resultados do impacto do material na placa metálica, por microscopia eletrônica, indicaram que a uma velocidade considerada baixa, de 3,9 quilômetros por segundo, um grande número de nanotubos permaneceu intacto ao se chocar uns com os outros.
Alguns resistiram a uma velocidade de 5,2 quilômetros por segundo. Mas muito poucos nanotubos foram encontrados em amostras que quebraram a uma velocidade de 6,9 quilômetros por segundo.
Estruturas diferentes
Ao analisar a estrutura dos nanotubos, os pesquisadores observaram que os impactos sob alta energia e velocidade desencadearam ligações atômicas nos nanotubos ao quebrar e que, às vezes, se recombinaram em estruturas diferentes.
Muitos deles dividiram-se em nanofitas após o choque. E outros apresentaram uma abertura como se tivessem sido cortados por uma “faca” na direção longitudinal.
“Esperávamos que durante o impacto em alta velocidade os nanotubos de carbono fraturassem mais do que abrissem. E o que observamos em nossas simulações e nos testes é que, dependendo da condição do impacto, o material sofre uma pressão tão grande e instantânea que não dá tempo para que frature; o nanotubo abre longitudinalmente”, explicou Galvão.
Os pesquisadores também observaram que, às vezes, a temperatura e pressão no local onde os nanotubos de carbono sofrem a fratura é tão alta que causa a produção de nanodiamantes.
E os poucos nanotubos e nanofitas que resistiram ao impacto nas velocidades mais altas frequentemente se soldaram, como foi possível observar em imagens de microscópio eletrônico de transmissão.
“A partir dessa constatação, desenvolvemos uma técnica por meio da qual ao passarmos uma corrente elétrica bem alta e rápida nos nanotubos eles se fundem localmente. Com isso é possível obter um material bem mais resistente do ponto de vista mecânico, que pode ter aplicações na indústria aeroespacial”, apontou Galvão. “O que aprendemos com a quebra dos nanotubos de carbono, estamos usando agora para reforçar esse material”, avaliou.
De acordo com o pesquisador, apesar de ainda não serem usados em estruturas aeroespaciais, os nanotubos de carbono têm sido utilizados em compósitos – combinação de dois tipos de materiais – nas asas e outras partes de aviões de passageiros.
Alguns dos fatores que têm limitado a aplicação desse material na própria indústria da aviação, contudo, são o alto custo e o baixo conhecimento sobre a interface de compósitos em escala nanométrica.
“Uma fabricante de aeronaves que pretendia utilizar compósitos feitos com nanotubos de carbono na estrutura do avião, com o objetivo de diminuir o peso e aumentar um pouco a condutividade na cabine, enfrentou muitos problemas na fase de projeto e teve grandes prejuízos. Ainda há muito o que aprender sobre a aplicação de nacompósitos em aeronaves”, afirmou Galvão.
Os vídeos das simulações feitas pelos pesquisadores de como os nanotubos se deformam quando disparados contra o alvo metálico e da interação entre dois nanotubos durante o impacto podem ser visualizados em youtu.be/aOYHWaD27xE e youtu.be/9H3DOmIzoCI.
Fonte: Agencia Fapesp 20/02/2017